terça-feira, 28 de novembro de 2017

"Luís Pedro Viana, Uma Retrospectiva"

Uma inexplicável mistura de realidade e imaginação, pode sempre ser analisada mais profundamente sob o aspecto ou temática do olhar perscrutante que transforma o que vê em imagem. Esta, porém, não dá conta da representação, como que informando que nem a arte tradicional, nem a tecnologicamente mais avançada são capazes de traduzir as contradições de que se alimenta o universo vivenciado pelo artista, numa contemplação permanente entre a estética, a narrativa que a cor e a forma nos proporcionam na transversalidade da sua pintura, e a história transportada à tela pela fina capacidade de ver nos interstícios do tempo: vejam-se as temáticas últimas, de Quixote e Cervantes a Shakespeare, onde, pelas lentes de um geometrizante esteta, que nunca deixou de ser, nos revela a história no que ela tem de melhor, é dizer, a alma capturada dos modelos de acordo com o narrador onisciente.
O artista define-se, aqui e além, um hedonista. E é-o, sem dúvida, mas um hedonista civilizado com relação a esse lugar do belo que permanentemente procura, o que revela uma dupla perspectiva em toda a sua obra, de duas coordenadas, uma interna, a portuguesa, e outra externa, a do mundo. A genialidade da sua obra também está em construir esse trajeto, um olho voltado para lá, o outro para as entranhas da sua sociedade, cruzando ambos na geometria descentralizada dos seus temas, onde o artista foi buscando a especiaria alheia, sempre temperada com o molho indisfarçável da sua fábrica, fantasiosamente colorida, superiormente contada. E lá está, sempre, o traço indisfarçável da originalidade por detrás de um mistério a ser desvendado. As relações entre a cor e a forma, na geometria estonteante que domina a pintura do artista, revelam-nos o ser artístico que é, desde o maravilhamento que se adivinha pelo cubismo picasseano, até à busca do entendimento histórico passado à tela. E o resultado desta nova estética na trajetória de Luís Pedro Viana, revisitando os mitos para se descobrir a sua humanidade, não poderia ser mais feliz, fixando-se numa questão intelectualmente mais profunda: as técnicas não são neutras porque são os artistas que decidem o seu sentido e valor. O seu percurso, revelado em perspectiva, mostra-nos agora que o seu objetivo último, que salta das telas, foi alcançado: a responsabilidade ética da arte, para deleite de quem contempla a obra.

Ângela Loureiro

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